|
24/10/2013
Texto de orelha
É grande o arco das questões tratadas neste livro. Em primeiro lugar, ele não se limita a uma discussão acadêmica das relações entre literatura e história - discussão que, no entanto, não deixa de realizar no mais alto sentido. Mas, para entender a sua abrangência, precisamos levar em consideração o modo como ele mesmo se coloca entre a literatura e a história. Não por acaso estão reunidos aqui ensaios de fôlego sobre poesia, sobre ficção e sobre história das ideias, juntamente com palestras, aulas inaugurais, alocuções, prefácios (alguns bastante alentados), artigos de jornal e entrevistas.
Pode-se estender a todos esses escritos, mesmo que em dimensões diferentes, o caráter de intervenções, palavra com a qual o autor nomeia uma das seções do livro. Independentemente de seu peso, os textos são sempre densos pela qualidade da carga informativa, das articulações internas e do espírito problematizador que os move. Mas a sua diversidade acusa o fato de eles estarem colocados em situação de empenho, seja em defesa da poesia - vale dizer, da literatura, em um tempo (antes inimaginável) em que isso se tornou necessário -, seja num exame das formações ideológicas e contraideológicas em contexto brasileiro e mundial, seja historiando os caminhos e os descaminhos da educação no Brasil, seja limpando a tralha das distorções históricas e redimindo os esquecimentos impostos pela ditadura, esclarecendo o conceito de não-violência ativa, combatendo pela defesa do meio ambiente e contra a ampliação do uso da energia atômica como solução energética. Alfredo Bosi desenha ainda, junto com o balanço de seu próprio itinerário, os perfis de figuras intelectuais e humanas que lhe são caras, como Jacob Gorender, Otto Maria Carpeaux e Celso Furtado.
Em outras palavras, trata-se de um humanista de formação totalizante, como só se encontra entre aqueles nascidos antes da Segunda Guerra Mundial, vivamente enfronhado na história da cultura, fiel a seu catolicismo de esquerda, confrontado com a redução de horizontes imposta pela vida contemporânea, com os estragos da voracidade capitalista, rastreada por ele nas contradições de base da ideologia liberal, e crítico empenhado, ao mesmo tempo, dos limites do formalismo, do sociologismo e do pensamento pós-moderno. A tudo que possa haver de agônico nessa posição, Bosi responde com a inquietação e a grandeza de uma ação intelectual que mostra fôlego para refletir sobre grandes conjuntos e para intervir em questões atuais que envolvem a literatura, a história e o muito que se passa entre elas.
José Miguel Wisnik
| |