Narcisa Amália
Textos em apêndice de Pessanha Póvoa, Machado de Assis e Narcisa Amália
Leitura obrigatória do vestibular da Fuvest 2026-29
304 p. - 14 x 21 cm
ISBN 978-65-5525-223-1
2025
- 1ª edição
Em 1873, um ano após o lançamento de Nebulosas, um crítico português de renome considerou que os versos do livro mais pareciam “trabalho de um poeta de combate do que estrofes saídas da pena de uma senhora”. A observação dá a medida do espanto que causou a obra de Narcisa Amália, publicada em 1872, quando tinha apenas vinte anos de idade, e da resistência que encontrou.
A presente edição procura resgatar do esquecimento a obra dessa poeta singular, abolicionista, republicana e feminista, pioneira em vários campos. Para isso, foi feito um cotejo minucioso com o texto da primeira edição de 1872, o que permitiu recuperar a divisão original do livro em três partes e o sentido de muitos versos, obscurecido pelo acúmulo de erros em sucessivas publicações.
O volume conta com uma apresentação da historiadora e socióloga Maria de Lourdes Eleutério, que situa a escritora e sua obra no quadro das ideias e das disputas políticas do Brasil à época, analisando a recepção de Nebulosas no meio literário de então. Todos os poemas do livro são acompanhados por notas, glossário e um comentário que oferece chaves de leitura para o seu entendimento.
Completam a edição o prefácio original de Pessanha Póvoa, a crítica de Machado de Assis feita no ano de seu lançamento (1872), o ensaio “A mulher no século XIX”, de Narcisa Amália (1882), e dois poemas adicionais de sua autoria, “Perfil de escrava” (1879) e “Por que sou forte” (1886).
Texto orelha
Em novembro de 1872, uma jovem de vinte anos, moradora de Resende, no vale do Paraíba, entregava os originais de seu livro à célebre casa editorial Garnier, no Rio de Janeiro. Um mês depois os jornais anunciavam que já se encontrava à venda Nebulosas, volume de poemas da poeta, ensaísta, professora e tradutora Narcisa Amália. A obra não passou desapercebida. Escreveram sobre ela críticos importantes da época, e até mesmo Machado de Assis, que acabara de lançar seu primeiro romance, resenhou o livro e elogiou a autora. Muitos outros, como Raimundo Correia, José do Patrocínio e Fagundes Varela, escreveram poemas louvando seu gênio e sua beleza. Se Narcisa já era amplamente admirada por sua atuação decidida na imprensa — sendo hoje considerada a primeira mulher a se profissionalizar como jornalista no Brasil —, tornou-se ainda mais célebre com a publicação de Nebulosas. No entanto, embora sua obra permanecesse em evidência por vários anos e fosse motivo de inspiração para muitas mulheres leitoras e escritoras em nosso país, na passagem do século XIX para o XX sua contribuição à literatura e ao debate de ideias foi relegada ao esquecimento. A presente edição procura resgatar o significado da vida e da obra de Narcisa Amália. Com esse intuito, elegeu como fonte o texto da primeira edição de Nebulosas, que pode ser consultada na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin da USP. A leitura atenta dessa primeira edição permitiu não apenas corrigir inúmeros equívocos de outras edições, mas restabelecer o sentido original de muitos versos, tornando compreensíveis trechos antes inteiramente obscuros. Para fazer jus às múltiplas dimensões da autora e de seu livro, esta edição conta com uma apresentação da professora Maria de Lourdes Eleutério, que contextualiza a vida e a obra de Narcisa Amália, ressaltando a originalidade de sua atuação e, ao mesmo tempo, a importância dos diálogos e das leituras que a formaram como poeta, intelectual e militante abolicionista, republicana e feminista. O que se revela é uma personalidade refinada e combativa. Contemporânea de Castro Alves, o poeta brasileiro com quem mais partilha afinidades, Narcisa soube dialogar de maneira independente não apenas com seus pares, mas também com poetas e escritores que a precederam. Assim, encontram-se em Nebulosas cantos de louvor à natureza que são também uma exaltação de brasilidade, como acontece nos poetas da nossa primeira geração romântica, mas acrescidos de intuições sobre a dimensão restauradora da natureza que não perderam em nada a sua atualidade. As saudades da infância, motivo central em Casimiro de Abreu, também comparecem, porém com um toque de drama que não vemos no poeta de “Meus oito anos”. O desânimo e o desespero febril próprios a Álvares de Azevedo se fazem presentes, mas cedem espaço ao ímpeto revolucionário que anima poemas como “Vinte e cinco de março”, “Pesadelo” e vários outros. Como observa Eleutério em sua apresentação, a “insubmissa Narcisa Amália” fez de sua produção literária, jornalística e ensaística uma profunda declaração de amor às letras. Corajosa, a obra dessa poeta libertária e apaixonada tocou em questões fundamentais para a identidade da jovem nação brasileira — nação que ela desejou justa, livre e democrática. Por tudo isso, a leitura de Nebulosas permanece relevante mais de 150 anos após o seu lançamento.
Sobre a autora
Filha de Narcisa Ignácia e Jácome de Campos, ambos professores, Narcisa Amália nasceu em 1852 em São João da Barra, RJ. Em 1863 muda-se com a família para Resende, então próspera região cafeeira às margens do rio Paraíba, onde viveria até os 35 anos. Atuante desde cedo na imprensa, hoje é reconhecida como a primeira mulher a se profissionalizar como jornalista no Brasil. Em 1872, com vinte anos, publica pela editora Garnier, do Rio de Janeiro, seu livro de poemas Nebulosas. A obra é bastante comentada e vale à autora diversas homenagens. Admirada por sua beleza e inteligência, recebeu também críticas ácidas, que consideravam inadequado que uma mulher se manifestasse sobre temas como o fim da escravatura e da monarquia. Após um breve casamento em 1866, quando tinha treze anos, com João Batista da Silveira, falecido em 1876, Narcisa Amália casou-se novamente em 1880 com Francisco Cleto da Rocha. Após alguns anos, no entanto, o segundo marido, ressentido com a vida intelectual da esposa, proibiu-a de frequentar saraus literários e passou a espalhar a calúnia de que não era ela a autora de seus versos. Narcisa separa-se de Cleto da Rocha em 1887 e muda-se no ano seguinte para o Rio de Janeiro, levando consigo a filha, Alice Violeta, nascida em 1883. Na então capital do país, prestou concurso público, o que lhe permitiu ganhar a vida como professora primária, e chegou a fazer parte do Conselho Superior de Instrução Pública. Faleceu em 1924, aos 72 anos.
Sobre a organizadora
Professora, historiadora e socióloga, Maria de Lourdes Eleutério nasceu em Jaú, SP, em 1952, e graduou-se em História na PUC-SP em 1975. Concluiu o mestrado na mesma universidade, em 1985, sobre Oswald de Andrade, e doutorou-se em Sociologia pela USP em 1997, com uma extensa pesquisa sobre escritoras brasileiras dos séculos XIX e XX, entre elas, Narcisa Amália. Entre 1994 e 1998 trabalhou no IDESP, integrando a pesquisa coletiva “História Social da Arte no Brasil”. Começou a lecionar em 1974, tendo trabalhado no ensino fundamental, médio e superior em várias instituições públicas e privadas. Desde 2009 é professora do curso de Artes Visuais da FAAP, em São Paulo. É autora dos livros Oswald: itinerário de um homem sem profissão (1989) e Vidas de romance: as mulheres e o exercício de ler e escrever no entresséculos (2005), além de Heitor dos Prazeres (em colaboração com Elaine Dias) e Antônio Parreiras, ambos publicados pela Folha de S. Paulo e Instituto Itaú Cultural em 2013.
Veja também
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